CGD, outro albergue da imoralidade

Faria de Oliveira, putativo e oportunista como sempre, distribuiu hoje matéria noticiosa sobre a estratégia de desenvolvimento de negócios e a política de remunerações do banco do Estado, CGD, a que preside. Primeiro, admite alienar o negócio dos seguros – Caixa Seguros e Saúde SGPS – para realizar 1.000 milhões de euros de receita; segundo, escreveu ao Ministro das Finanças a solicitar que a Caixa Geral de Depósitos, com 10.600 trabalhadores, seja dispensada de aplicar a redução de 5% da massa salarial decidida para o Sector Empresarial do Estado (SEE), como extensão das medidas de austeridade do governo para a Função Pública.

Vamos por partes. Ao que se percebe, a venda da actividade seguradora visa obter fundos para melhoria dos rácios de capital da CGD, entretanto deteriorados. Claro que, inspirado nas instruções da tutela, o banco do Estado despendeu avultadas somas no BPN e, para se ressarcir de 20% da desastrosa aplicação, se vê coagido a alienar negócios rentáveis explorados por Fidelidade Mundial, Império Bonança, Via Directa, Multicare, Garantia (Cabo Verde) e Companhia Portuguesa de Resseguros, entre outras. Trata-se, de facto, de uma delapidação de património de interesse público, imposta pela incompetência governamental e da administração da CGD que, em 2009, teve os lucros reduzidos em 39,2%.

Quanto à redução da massa salarial, esta calculada em 450 milhões de euros, Faria de Oliveira  teme fuga de quadros. Diz ele, segundo os jornais, que a CGD está a operar no mercado e, por efeito da concorrência, corre o risco de perder colaboradores para os privados. Além de demagógico, o argumento de Faria de Oliveira é ofensivo para a inteligência dos cidadãos. Alguém se convence que os outros bancos, os privados, não contratariam pessoal da CGD se pretendessem, mesmo sem a redução salarial? E quanto à concorrência; o que se passa com a CGD, já hoje sucede entre os hospitais do Estado e os privados. É ou não verdade que o sector privado da saúde, sem investir um cêntimo no ensino universitário da medicina em Portugal, anda a recrutar médicos e outros profissionais de saúde especializados no sector público, garantindo remunerações mais elevadas? Por que razão administradores e pessoal da CGD têm que ser excepção a estes mecanismos de mercado e poupados aos sacrifícios impostos a milhares de funcionários públicos, cujos vencimentos e regalias são, de longe, muito inferiores aos garantidos pelo banco do Estado?

Faria de Oliveira faz parte daquele lote de privilegiados que soube sempre navegar em águas tranquilas e generosas – para nós turvas. É um velho “boy” laranja. Foi ex-ministro de Cavaco, quadro superior do extinto IPE, donde saiu com choruda indemnização. Ingressou de imediato na HPP, empresa de saúde do grupo CGD, com a atribuição de um ‘Jaguar’ e de alta remuneração, transitou para a Caixa Espanha e, devido ao acordo “rosa-laranja”, acabou em presidente da CGD. Uma vida de muito trabalho e grande sacrifício! Como Mira Amaral, Armando Vara e muitos, muitos outros.

Comments

  1. Bom post!

    Inspirado por este artigo, fiz uma mini biografia deste amigo, quem estiver interessado pode consulta-la aqui. É incrível o curriculum deste senhor. A quantidade de sinecuras desafia a imaginação…

    Com o Mira Amaral ou com o Armando Vara é a mesma porcaria.

  2. carlos fonseca says:

    Helder, parabéns pelo trabalho. Que palavras poderiam descrever melhor o percurso deste senhor? Nenhumas. Na biografia, está lá tudo. É apenas ler e interpretar.´
    São homens deste género que ajudaram a levar o país à situação que sabemos.

  3. João Pedro Cristóvão says:

    Caro Carlos Fonseca
    Percebo que o foco principal do seu post seja a figura do Presidente da CGD.
    Mas, lamentavelmente, acaba por colocar no mesmo saco o futuro próximo dos 10.000 colaboradores desta instituição, os quais em nada contribuíram para esta”crise”.
    Colaboradores que (com as excepções que também se verificam nas outras empresas publicas ou privadas) trabalham todos os dias com afinco para que esta Casa continue a contribuir anualmente para as receitas (não para as despesas) do Estado.
    Será justo que trabalhadores que dedicaram uma vida à sua entidade patronal se vejam agora “despromovidos” e na expectativa de terem reformas reduzidas, sem que nada tenham feito para o merecer?
    Se a crise e o buraco nas finanças públicas são problemas nacionais, porque é que só uma minoria dos contribuintes vai ser (verdadeiramente) sacrificada? Que tal aumentarem as taxas do IRS e fazer reflectir o esforço por todos de uma forma bem mais suportável?
    Acha bem que eu tenha um corte de 200 ou 300 euros (a ver vamos) no meu vencimento, ao fim de 26 anos de carreira e sacrifícios, e que os meus colegas dos bancos privados, que já ganham bastante mais, ou o Carlos Fonseca (?) mantenham os seus salários intactos?
    Parece que temos Portugueses de 1ª e de 2ª (os funcionários públicos ou “equiparados”).

  4. carlos fonseca says:

    Caro João Pedro Cristovão,
    Tenho tanto respeito pelos cerca de 10.000 trabalhadores, como por todos os outros. Creia-me. Porém, uma vez instituída a medida de redução salarial para muitos mais milhares de funcionários públicos e de trabalhadores do SEE, sinto que excluir dessa medida os trabalhadores da CGD é uma injustiça relativa, sim, mas para os outros sacrificados. Sabe, certamente, que para além de terem um vencimento médio acima da Função Pública, contam com um conjunto de regalias excepcionais (sistema de saúde próprio e de qualidade diferenciada em relação à ADSE, remunerações a 100% em períodos de baixa, por exemplo). Por que razão isentar-vos de sacrifícios impostos a outros trabalhadores do Estado ou do SEE? Pertencem ou não ao SEE?
    Não estamos a tratar de assuntos pessoais, mas garanto-lhe que eu e a minha mulher nos reformámos há 3 anos do sector privado (eu, ao fim de 46 anos de Segurança Social) e, pelo 3.º ano consecutivo, o Governo reduz o nosso rendimento, por efeito de alterações da tabela do IRS e da redução da chamada ‘dedução específica’. Hoje, as pensões são menores do que há 3 anos e acabam de aumentar em 1,5% a retenção de IRS.
    Como vê, ao contrário do que afirma, há 3 anos que não temos “pensões intactas”. Se quiser, na sua acepção, sou português de 2.ª. Até pelo valor da pensão.
    Quanto ao seu presidente, critico-o pela demagogia que usou e, ainda, por ser um dos muitos oportunistas que, mercê de cargos de nomeação partidária, ganhou fortunas e contribuiu para o descalabro em que vivemos. De resto, a CGD é pródiga a fabricar milionários – António de Sousa, Celeste Cardona, Mira Amaral, Armando Vara, Alves Monteiro e tantos outros que, para citar todos, este meu comentário não terminaria tão cedo. Lembro que é a CGD e os seus apêndices, ou seja, Cx. Seguros, HPP, Fundimo, Cx. Leasing e Factoring são, de facto, albergues com cargos de luxo.
    Tem que reconhecer que nada me move contra os trabalhadores, em sentido puro, da CGD e participadas. Apenas a defesa da equidade de tratamento em relação a outros trabalhadores da FP e do SEE.
    Obrigado pela sua participação.

  5. João Pedro Cristóvão says:

    Caro Carlos Fonseca
    Não pretendo aprofundar a discussão do mérito de uma eventual diferenciação de tratamento entre os trabalhadores da função pública e do SEE, embora me pareça pertinente por vários motivos: a CGD é uma sociedade anónima sujeita às mesmas regras do restante sector bancário (não da função pública), concorre em condições de igualdade (desejavelmente) com os seus congéneres, não é considerada parte da função publica quando se trata de atribuir regalias aos empregados (tolerâncias de ponto, por exemplo) e não contribui para a despesa do Estado mas sim para a receita ordinária/ anual e extraordinária. Recordo que há uns anos o Governo então vigente extorquiu uma parte substancial dos nossos descontos para o Fundo de Pensões, com o objectivo único de minorar, mais uma vez, o défice orçamental.
    O que me parece mais revoltante neste “pedido de sacrifício” é que este não seja extensível a todos os Portugueses, mas apenas aos tais de 2ª.
    Se a crise é nacional porque não distribuir o sacrifício “equitativamente” por todos os contribuintes, através de um aumento de IRS ou de um imposto extraordinário, em vez de penalizar apenas cerca de 10% dos mesmos. Já reparou que um empresário ou um profissional liberal, que até consegue, por vezes, não declarar todos os seus rendimentos, é menos penalizado por estas medidas do que um funcionário público ou equiparado.
    Não será que este tratamento diferenciado por parte do Governo se justifica apenas por ser um mal menor, ou seja uma questão meramente política: mais vale sermos 10% de (muito) descontentes do que todo o eleitorado…
    Deixo-lhe, finalmente, a minha solidariedade e simpatia para com a sua situação de reformado, certo de que dentro de poucos anos (ou talvez não…) estarei na sua situação, ou pior, ao que tudo parece indicar…
    Um abraço!

  6. carlos fonseca says:

    Certamente concordará que é demasiado complexo estabelecer um debate exaustivo e incisivo sobre os temas que estamos a abordar.
    Obrigado a sintetizar, realço que existem outras empresas do SEE igualmente lucrativas e que proporcionam receitas ordinárias e extraordinárias ao Estado. A política de privatizações retirou igualmente ao Estado empresas lucrativas e estratégicas, geradoras de ganhos substanciais – a PT e a EDP constituem os casos mais eloquentes.
    A actividade da CGD nos últimos anos, sem responsabilidade dos seus trabalhadores, caracterizou-se pela aplicação de avultados fundos para resolver problemas do sector privado. O caso do BPN, mas também dos financiamentos a Joe Berardo e Manuel Fino são exemplares. Isto, a par da guarida de oportunistas, de que é exemplo o engenheiro civil, Mário Lino, a presidir ao Conselho Fiscal do banco do Estado. E porque é pública, a instituição deve ser questionada pela cidadania quanto aos resultados deste género de gestão. Não será, por força de actos destes, que se explica a quebra de 39,2% dos lucros da CGD em 2009, em relação a 2008? Enfim, são temas e subtemas para uma longa conversa.
    A apropriação do Fundo de Pensões da CGD, por Manuel Ferreira Leite, é parte integrante deste lógica neoliberal, em que se integram as referidas privatizações e toda uma série de operações de engenharia financeira, lesivas da transparência e do rigor das contas do Estado. Estes e outros exemplos são paradigmas do desempenho da CGD que, aceito, acaba por atingir os interesses dos seus trabalhadores legal mas ilegitimamente.
    Estou contra a medida da penalização dos salários na FP e no SEE, assim como estaria se aplicada ao sector privado. Os privados, a navegar em marés de exploração de precariedade, já castigam um exército de cidadãos, a que se adicionam professores não colocados, alto desemprego dos jovens (acima dos 23%) e de mulheres e homens acima dos 35 anos. É, de facto, caótico e, para paraísos, já bastam as ‘off-shores’. De resto, como diz Stiglitz o sistema financeiro não cria valor. Quem o cria é o sistema económico e, em Portugal, este está muito debilitado, devido a políticas erráticas dos últimos 35 anos.
    Por último, registo com gratidão a solidariedade para com a minha situação de reformado. Uma situação que, no futuro, poderá ocorrer consigo. Já nem falo das minhas filhas que essas, como milhões de portugueses no futuro, nem reforma terão, se continuarmos a trilhar tão injustos caminhos.
    Um abraço!

  7. carlos fonseca says:

    Caro João Pedro Cristovão,
    Por lapso, não personalizei a minha resposta. Aproveito para uma correcção: Manuela Ferreira Leite.
    Um abraço!

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  1. […] Governo e PSD, no âmbito do acordo orçamental, aprovaram legislação que, no caso do sector empresarial do Estado, deixa ao critério dos respectivos gestores a aplicação ou não de cortes salariais que, todavia, na FP são imperativos. Rui Rio, presidente da C.M.Porto, rebelou-se com inteira razão. Para o Governo já sabíamos que era assim, mas para a alternativa ‘laranja’ também há portugueses de 1.ª e 2ª., como já havia sido dito aqui no Aventar, a propósito da CGD. […]

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